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Bem-Estar Social e Serviço Social

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“O conceito de Bem-Estar é, comum ser utilizado na atualidade, como um valor e um direito, relacionado com o desenvolvimento individual e pessoal, com o desenvolvimento social e económico com vista a uma maior coesão social na sociedade globalizada. 

Quando tratamos o conceito de bem-estar social no domínio da intervenção social, afastamo-nos da ideia defendida pela psicologia e pela economia, ao definirem o conceito como satisfação de uma necessidade, resultante do consumo de um bem. No âmbito da intervenção social e da política social “(…), colocamo-nos na perspetiva do cidadão, portador de direitos que tem esses direitos realizados ou, ao invés, não tem esses direitos realizados devido à sua ausência” (Pereirinha, 2008:72). Assim, podemos definir Bem-estar Social como conceito que compreende as medidas sociais dirigidas à sociedade para satisfazerem as necessidades de pessoas e de grupos. Integra o termo Ação Social tanto dos poderes públicos, como de todos os agentes que possam contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos. Em contrapartida a este valor de bem-estar surgem com maior visibilidade na sociedade contemporânea o mal-estar provocado pela crise económica mundial (pobreza, endividamento das famílias, perda do emprego, …), associado também ao mau trato infantil e violência doméstica, ambos centrados maioritariamente na família. Segundo Garcia & Bracho (2006), “ Puede hablarse de bienestar en diferentes sentidos: bienestar personal o sociale, politicas de bienestar, Estado del bienestar o servicios de bienestar” (Garcia & Bracho (2006: 230). 

No que respeita ao Serviço Social, tratamos o conceito de bem-estar como um valor, um elemento constitutivo de uma cidadania plena de toda e qualquer pessoa, que, inserida na sociedade tem como direito humano a possibilidade de acesso às melhores condições e qualidade de vida. 

O Bem-Estar Social constitui desde sempre uma preocupação central no Serviço Social, tendo presente que um dos seus princípios e fundamentos se inscreve na Declaração Universal dos Direitos Humanos, valorizando em particular o direito ao desenvolvimento social e humano. Presentemente é fundamental referir a definição de Serviço Social Internacional: 

“A profissão de Serviço Social promove a mudança social, a resolução de problemas nas relações humanas e o empowerment e a autonomia da pessoa para melhorar o seu bem-estar. O Serviço Social, através da utilização de teorias do comportamento humano e dos sistemas de proteção social, intervém nos problemas das pessoas no contexto social envolvente. Os princípios dos direitos humanos e da justiça social são fundamentais para o Serviço social” (IFSW:2000). 

Outro princípio importante em Serviço Social designa-se de dignidade humana e autodeterminação, reconhecendo cada ser humano como uma pessoa com capacidades para aprender e reaprender a ganhar novas competências, enquanto membro de uma sociedade humana onde os valores da igualdade e da equidade presidem. 

Importa citar a proposta das Nações Unidas em considerar o desenvolvimento humano e os direitos humanos de forma integrada: 

“Os direitos humanos redigem-se quando as pessoas têm acesso seguro à liberdade e ao recurso a que se refere o direito. Em muitos contextos a melhor maneira de fomentar a realização dos direitos humanos passa pelo estabelecimento dos direitos no plano jurídico. Não obstante, não se devem confundir os direitos jurídicos com os direitos humanos, nem se deve supor que basta ter direitos jurídicos para que se realizem os direitos humanos” (Nações Unidas, 2000:25). 

Na atualidade o conceito de desenvolvimento ganha importância no campo do desenvolvimento social e local, constituindo-se num novo paradigma de intervenção social. O sistema de proteção à criança na sociedade contemporânea caracteriza-se pela sua universalidade no quadro normativo-legal e local no quadro da efetivação da resposta social aos problemas da criança e da família, exemplo disso são as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens, cuja unidade territorial de intervenção é local (Lei147/99, art.º15º). 

Neste âmbito, consideramos pertinente definir o conceito de desenvolvimento social e local. Este conceito integra três dimensões: 
  • Desenvolvimento pessoal que caracteriza a relação de ajuda com os beneficiários da ação; 
  • Desenvolvimento social que caracteriza o trabalho centrado nas solidariedades e no tecido social de um território; 
  • Desenvolvimento organizacional que caracteriza o processo de evolução participativa das organizações e uma nova gestão das políticas públicas. 
Conceito de desenvolvimento é mais amplo que o conceito de desenvolvimento social e local. O conceito de desenvolvimento, situa a ação no quadro da investigação/ação, na programação, no acompanhamento da mudança e na resolução de problemas sociais ou económicos. Desenvolvimento implica ainda produção na sociedade, centrado numa lógica de inovação ou de resolução de problemas e uma dinâmica social que coloca no centro da atenção os seus atores e os seus sujeitos (A. Touraine). 

Uma outra dimensão fundamental a considerar na análise do modelo de Bem Estar, respeita ao desenvolvimento pessoal. Este conceito integra entre outras dimensões as de valorização das potencialidades individuais e sua adaptação ao desenvolvimento (área de prioridade local no que respeita ao primeiro emprego e á perda de emprego). 

No modelo atual de sociedade cada cidadão é ator da sua evolução e do seu desenvolvimento, assim como o grupo cujos elementos são atores do seu desenvolvimento, mas todos somos coautores do desenvolvimento de uma comunidade local. O desenvolvimento local é um processo coletivo que permite identificar algumas soluções para os problemas económicos e sociais, baseando-se em duas correntes: 
  • A corrente económica e social que visa essencialmente o desenvolvimento económico e a reorganização do território; 
  • A corrente solidária que procura essencialmente desenvolver os recursos sociais de forma adequada à resolução das questões sociais comunitárias.
Ambas as correntes são complementares e dinamizam-se reciprocamente. A Corrente económica e social, promove a criação de projetos de desenvolvimento local. A corrente de solidariedade, promove a mobilização dos serviços e dos cidadãos (beneficiários) sobre projetos centrados na satisfação das necessidades sentidas pelas comunidades locais e que são apoiadas pelos decisores locais e nacionais. 

A partir dos anos noventa o desenvolvimento humano ganhou maior importância no discurso político e nas práticas profissionais, também muito reforçado na estratégia de Lisboa (2000) e com maior associação aos direitos humanos. As Nações Unidas definiram o desenvolvimento humano, como: ”centra-se no fortalecimento das capacidades e liberdades dos membros de uma comunidade, e os direitos humanos representam as reivindicações que as pessoas têm pelo respeito da conduta individual e coletiva ou das estruturas de mecanismos sociais para garantir essas capacidades e liberdades (PNUD, 2001:20). Segundo Garcia & Bracho (2006), “ (…) podemos considerar que há bem-estar e qualidade de vida quando as condições de vida de uma pessoa, num grupo social específico, permitem o seu pleno desenvolvimento humano”. 

Presentemente no quadro da globalização e de uma crise económica mundial, podemos assistir de novo a uma nova crise do Estado de Bem-Estar, conforme aconteceu nos finais dos anos setenta do Século XX. A crise económica atual tem tendência a um aumento dos problemas sociais, nomeadamente: 
  • Perda de emprego (ex: mês de Janeiro de 2009 em Portugal 70 000 pessoas perderam o emprego), endividamento das famílias, aumento da pobreza, perdas de habilitações, etc.
Estamos de novo perante o debate sobre a capacidade dos sistemas de proteção social se adaptarem às novas realidades económicas e sociais não só ao nível do Estado Membro, mas no quadro da União Europeia. A este nível atuam as politicas sociais, principalmente as direcionadas para a proteção social assegurada pelo sistema de Segurança Social, incluindo uma relação de parceria às respostas públicas ao nível da saúde, habitação, educação, emprego e serviços sociais, bem como as organizações não governamentais do sociedade civil. Assim, podemos concluir que a política social é uma forma de promover o desenvolvimento humano e o bem-estar social das pessoas. 

Em todos estes problemas, a Sociedade e o Estado requerem a atuação do Serviço Social, como forma de promover os direitos humanos e a justiça social enquanto princípios e fundamentos de uma cidadania social. 

Objetivo máximo da intervenção do Serviço Social é facilitar e criar oportunidades de desenvolvimento das potencialidades individuais e coletivas para que todo o cidadão exerça as suas competências e responsabilidades sociais e individuais. O Serviço Social no quadro do paradigma construtivista, caracterizado pelo conhecimento que podemos construir do real, como resultado da sua própria experiência. A ação desenvolve-se no contexto da construção do conhecimento. 

Neste paradigma encontramos uma relação forte entre conhecimento e representação, reconhecendo esta como uma mediação que possibilita partilhar o conhecimento produzido. E na perspetiva do desenvolvimento social e humano e na promoção de igualdade de oportunidades e da não discriminação, atua e promove o empowerment. O modelo de empowerment, emerge nos países anglo-saxónicos depois dos anos 60 no âmbito das organizações comunitárias e segundo Donzelot, ganha força como termo de participação nos Estados Unidos. 

Este modelo de empowerment não substitui a participação, porque este procura otimizar atividades que favoreçam a participação. Descreve o processo que o sujeito deve ter em conta no seu projeto individual e coletivo ao nível da comunidade local. Supõe um trabalho centrado sobre a pessoa e sobre as relações interpessoais. Isto é, promove na pessoa a capacidade de investimento sobre si próprio e de agir sobre os outros, bem como de aprender a utilizar o coletivo para realização dos objetivos pessoais. Este modelo é retomado nos Estados Unidos nos anos 80 como reação aos programas de prevenção centrados só no sujeito sem ter em conta os contextos sociais e as experiências do sujeito. Isto é, procura fazer com os que não têm voz, que adquiram essa voz. Garcia & Bracho (2006), “Los profissionales del Trabajo Social puden contribuir a que las personas sean capaces de dirigir su própria vida o, de lo contrario, pueden convertirse en agentes de violência institucional” (Garcia & Bracho (2006:244). 

O Serviço Social assume particular papel na integração social, promovendo a participação plena de todo e qualquer cidadão, na vida social, cultural, económica e política, enquanto consequência da efetiva aplicação dos direitos humanos e do princípio de igualdade de oportunidades para todos. Centra-se nas capacidades do sujeito para potenciar competências pessoais, sociais e relacionais que o, vão ajudar a exercer a sua cidadania, utilizando os recursos e as politicas sociais ativas e promove respostas inovadoras através das redes de Solidariedade Social e do novo compromisso assente na participação e reconhecimento da pessoa como parceiro na própria intervenção..."


FERREIRA, Jorge Manuel Leitão - Serviço Social e modelos de bem-estar para a infância: modus operandi do assistente social na promoção da protecção à criança e à família [Em linha]. Lisboa: ISCTE-IUL, 2009. Tese de doutoramento. Disponível em www:<http://hdl.handle.net/10071/3590>. ISBN 978-989-732-144-3. 

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